Quando a reciclagem é lixo?


Com objetividade, responde-se:

─ “É lixo quando produz criações que vão acabar na lixeira”.

Deveria ser chamado, no máximo, de processo de reciclagem relâmpago. O criador leva dez dias pensando sobre qual criação deverá fazer. Mais outros tantos para saber como montará a dita criação, imaginando com quais materiais será melhor trabalhar. Cinco dias depois descobre que pode encontrar todos em sua própria lixeira. Gasta outros cinco dias tentando montar uma espécie de protótipo, o qual nunca ficará pronto e, breve como um relâmpago, retornará à origem: a lata de lixo!

Na melhor das hipóteses, trata-se do reaproveitamento de partes descartadas de objetos, usadas com finalidade de artesanato e não propriamente de produção. Por isso mesmo, a qualidade da obra depende da qualidade artística de seu criador e do gosto de quem os adquire ou receba-os de presente. No mais das vezes, é “presente de grego”, que somente traz (pouca) alegria ao criador. Resultado: retornará à origem.

Sem entrarmos no mérito e nas finalidades desses “produtos de reciclagem”, a foto abaixo fala por si só. É um bom exemplo de doença mental obsessiva

Bilboquê feito de garrafa pet

Siriema, Cariama cristata


Siriema, Cariama cristata

“A voz do Brasil Central”, H. Sick.

As aves do cerrado sofrem sempre a influência dos períodos climáticos para reproduzir e sobreviver. No verão de 2011, com chuvas intensas, bem como no outono e no inicio do inverno em 2012, praticamente com constante ocorrências de chuvas, aves como a siriema, que só procriam no inicio de setembro, já se acomodam sobre seus ovos fora do seu período normal reprodutivo.

Texto e foto do Professor Nunes D’Acosta Nunes

Morcegos hematófagos e suas vítimas


Morcegos são os únicos mamíferos voadores de que se tem notícia, tendo seus membros anteriores transformados em asas, distintas das asas de aves e pássaros.

Tradicionalmente, são divididos em dois grupos: os morcegos propriamente ditos (subordem Microchiroptera) e as chamadas raposas-voadoras (subordem Megachiroptera). Representam um quarto de toda as espécies de mamíferos do mundo. São mais de mil espécies, que possuem uma grande variedade de formas e tamanhos, podendo ter envergadura desde de cinco centímetros até cerca de dois metros. Possuem excelente capacidade de adaptação a quase qualquer ambiente e uma ampla diversidade de hábitos alimentares. Somente não ocorrem em áreas glaciais do planeta.

Pequena parte das espécies de morcegos

Dentre todos os mamíferos, os morcegos possuem a dieta mais variada pois comem frutos, sementes, folhas, néctar, pólen e artrópodes (morcegos frugívoros e granívoros). Já os morcegos hematófagos alimentam-se de pequenos vertebrados, peixes e sangue. Apenas três espécies destes animais sanguinários alimentam-se exclusivamente de sangue e, hoje, existem somente na América Latina (que coisa curiosa…).

Close de um morcego hematófago

Embora deem arrepios em alguns humanos, os frugívoros, em especial, contribuem para acelerar a dinâmica dos ecossistemas, atuando como polinizadores, dispersores de frutas e sementes, bem como na predação de insetos (inclusive pragas agrícolas), dentre outras habilidades. Possuem ainda o sentido especial da ecolocalização (orientação por ecos), que utilizam para orientação, busca de alimento e comunicação. Dai deriva seu nome, “mur” – do latim arcaico “mure”, significando “rato” –, acrescido de “cego”. “Rato cego” é o significado exato para morcego (que coisa curiosa…).

Contudo, também atuam de forma adversa como vetores de várias doenças e zoonoses (inclusive a raiva, transmitida pelos irmãos hematófagos). E isso não constitui propriamente uma contribuição (que coisa curiosa…).

Ficamos imaginando quais “espécies”, dentre os seres humanos, lembram-nos os morcegos hematófagos definitivos?… Precisam gostar de devorar o sangue alheio, voar como cegos, viver na escuridão e possuir uma espécie de ecolocalização para não trombar com a justiça. Ficamos com “raiva“. Somente vieram à cabeça os políticos latino-americanos e seus empresários preferidos…

Sindicato patronal dos hematófagos

Linha de tempo do cinismo


Por Raquel Júnia, Jornalista.

Na aula inaugural da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio/Fiocruz, a pesquisadora Camila Moreno faz um histórico detalhado das Nações Unidas, das conferências sobre (…) o ambiente e explica o que está por trás do discurso da Economia Verde, rumo a Rio+20.

Caricatura escolhida pelo blog

Quase ninguém mais consegue negar que o mundo vive hoje uma crise ambiental – poluição do ar, do solo, das águas, extinção de espécies, inundações, desabamentos, falta d’água – enfim, inúmeras evidências de que há um desequilíbrio no (…) ambiente. Mas o que pode ainda não estar tão claro é que, apesar de perversa para a maior parte das pessoas, a destruição dos bens naturais pode gerar lucros para uma minoria. E como isso acontece? Essa pergunta foi respondida na aula inaugural da EPSJV/Fiocruz com a conferência Rio+20: a quem serve a economia verde?, proferida por Camila Moreno, no último dia 22 de março. “Se existisse floresta por todos os lados, alguém pagaria por um espaço para que as araras pudessem se reproduzir? Se tivesse água limpa por todos os cantos alguém pagaria por água?”, diz a pesquisadora. Ela explica que a Economia Verde carrega uma grande contradição: ela só produz riqueza quando há escassez dos recursos naturais.

Camila Moreno, que é coordenadora de sustentabilidade da Fundação Heinrich Böll e acompanha há vários anos as convenções sobre clima e biodiversidade das Nações Unidas, definiu com riqueza de detalhes a história da ONU e da transformação da economia ao longo do tempo. “Para falar de Economia Verde e Rio+20, primeiro temos que falar sobre o que é uma Conferência das Nações Unidas. As Nações Unidas surgiram no mundo a partir de 1944, antes disso existia algo chamado a Liga das Nações”, inicia a pesquisadora, que também é membro do GT de Ecologia Política do Conselho Latinoamericano de Ciências Sociais (Clacso) e do Conselho Internacional da Red por uma America Latina Libre de Transgenicos (RALLT). Com humor, Camila compara a Liga das Nações, que deu origem a ONU, com a reunião dos super-heróis dos desenhos animados “para salvar o mundo do mal”. “Depois da 2ª Guerra Mundial é impossível pensar o mundo sem pensar o que é o multilateralismo, que é esse espaço construído pós 2ª Guerra Mundial – as Nações Unidas. E lá cada país tem direito a um voto. O voto de um país africano em tese vale o mesmo que o voto da Alemanha ou da França, mas o que acontece é que essa estrutura que se montou para justamente governar o mundo vem passando por profundas transformações e sendo profundamente questionada”, diz. Ela explica que a formação de grupos de países, como os G7 e G20, fez uma alteração na correlação de forças dentro das Nações Unidas, dando mais poder às grandes potências.

A pesquisadora detalha também as transformações no conceito de economia, o que, para ela, é outro conhecimento fundamental para quem quer compreender a proposta de Economia Verde. Camila observa que a palavra economia vem da palavra grega ‘oikos’, que significa cuidar da casa, ou seja, fazer toda a gestão do abastecimento, garantir que haja animais para a alimentação, plantio, etc. O dinheiro, símbolo da economia atual, também não era em papel ou moedas como é hoje. “Já foram utilizadas conchas, sementes de cacau, pecinhas de cerâmica. Uma série de coisas foi usada ao longo da história para que as pessoas trocassem e esse valor nas trocas permanecesse estável”, comenta. De acordo com a pesquisadora, as ideias de economia ligadas a crescimento fazem parte da história mais recente. “Essas são ideias recentes na história. Porque quando a gente pensa em oikos, esse cuidar da casa não significa derrubar a casa dos outros, ocupar e passar por cima e ir crescendo e acumulando. Porque eu não posso crescer a ponto de expulsar os outros para fora da Terra. Talvez em algum momento eu possa construir naves espaciais e mandar todos os que sobram para outro planeta”, ironiza.

Linha do tempo

Camila destaca vários momentos importantes para compreender como o mundo chega hoje à Rio+20 com a proposta oficial da Economia Verde como solução para a crise mundial. Seguindo a linha do tempo, a pesquisadora ressalta a realização da Conferência de Bretton Woods – quando foram criados o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI) – e a Guerra Fria, que dividiu o mundo no bloco socialista e o bloco capitalista. Da mesma forma, a própria criação da ONU e da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), presidida pelo brasileiro Josué de Castro, é considerada um marco nesse processo. “Josué de Castro coloca bem claro que a fome e a questão da alimentação do mundo são problemas essencialmente políticos. Não é a toa que ele fala isso. Naquele tempo a estratégia da Guerra Fria, de como vencer o bloco comunista, foi fazer uma Revolução Verde baseada na ideia de transformar massivamente os ecossistemas do mundo em grandes monoculturas dependentes de sementes híbridas. Pela primeira vez na história, os camponeses teriam que comprar as sementes a cada colheita e usar todos os químicos que sobraram da 2ª Guerra”, critica.

Entretanto, segundo Camila, houve quem questionasse o discurso da Revolução Verde. Outro marco importante para a pesquisadora é a publicação do livro Primavera Silenciosa, da bióloga norte-americana Rachel Carsons, em 1962. “Estudando os botos na costa da Califórnia, ela descobriu que toda a vida marinha está profundamente contaminada pelo uso cumulativo dos agrotóxicos, que entram na terra, permeiam o ciclo das águas e não saem da natureza. Ela diagnosticou não apenas a extinção de várias espécies, mas também que esses químicos e esses venenos atingem a maioria da população”, relata. O livro, ressalta Camila, fez um grande sucesso e foi considerado a fundação do movimento ambientalista nos Estados Unidos, que depois se espalhou para outros países.

No início dos anos 70, outra publicação teve papel importante no processo que culminará com a Rio+20, mas dessa vez corroborando o pensamento de privatização da natureza. Trata-se do texto A tragédia dos Bens Comuns, de Garret Hardin, que defendia a ideia de que tudo que é público está fadado a desaparecer. É nesse contexto, segundo Camila, que é realizada a primeira conferência da ONU sobre (…) Ambiente, em 1972, na cidade de Estocolmo. “Pela primeira vez esses países, dentro da estrutura das Nações Unidas, se juntam para pensar o (…) ambiente humano. Mas o que acontece é que um ano depois dessa Conferência de Estocolmo, quando deveria ser lançada uma agenda para pensar como proteger o (…) ambiente como um bem comum, acontece um grande baque na história com a Crise do Petróleo”, aponta. A pesquisadora conta que nessa época é criada a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) e a economia entra na época da financeirização, ou seja, acaba o lastro das moedas em ouro. “Hoje, como não tem mais o ouro, como o dinheiro é todo virtual, como a nossa economia internacional é toda entregue ao capital financeiro, das bolsas de valores, o sistema econômico precisa dar um salto, e é esse salto que vai se cristalizar na Rio+20, onde o esforço será o de convencer o mundo de que agora entramos na era do capital natural”, fala.

Nos anos 80, continua Camila, dois personagens – o então presidente dos Estados Unidos Ronald Reagan, e a primeira ministra britânica Margareth Thatcher – protagonizaram outro momento importante na história: eles são os grandes defensores, bem como colocam em prática, as políticas neoliberais. A pesquisadora explica que as reformas implementadas pelos dois governantes, chamadas de “ajustes estruturais”, consistiram em privatização e precarização dos direitos dos trabalhadores. “Essas medidas que de maneira geral transformaram todas as economias do sul numa mesma época ficaram conhecidas como o Consenso de Washington”, detalha. Além deste Consenso, de acordo com a pesquisadora, outro consenso também é forjado um ano antes – o relatório escrito pela primeira ministra norueguesa Gro Harlem Brundtland a pedido das Nações Unidas chamado “Nosso futuro Comum”, que traz pela primeira vez o termo desenvolvimento sustentável. Camila destaca a semelhança do nome desse relatório com o título do documento para a Rio+20: O futuro que queremos. “Mas a pergunta que não quer calar é: quem queremos? Essa é uma pergunta que devemos fazer sempre, quem fala em nosso nome? A quem interessa?”, alerta.

Queda do muro de Berlim

Para Camila, o ano de 1989, quando houve a queda do Muro de Berlim e o fim da Guerra Fria, também é outro período fundamental para entender a conjuntura do mundo. Pouco depois, em 1992, é realizada no Rio de Janeiro a Conferência das Nações Unidas sobre (…) Ambiente e Desenvolvimento – a ECO 92. “Para celebrar essa vitória de um sistema sobre o outro é que se realiza a Conferência do Rio, sob o governo do Collor, e que traz ao Rio 108 chefes de estado e de governo num momento histórico até hoje jamais repetido. Em nenhuma outra ocasião tantas autoridades mundiais estiveram juntas em um mesmo lugar”, diz. Camila detalha que nessa Conferência, para dar uma justificativa à sociedade civil, são assinadas três convenções – sobre clima, diversidade biológica e combate à desertificação – os mesmos temas que estão na pauta da Economia Verde. “Vinte anos depois, o que a Conferência Rio+20 oferece é: o mercado do clima, da biodiversidade e do solo”, protesta.

Apesar disso, segundo Camila, a sociedade civil não ficou pacífica diante das propostas de mercantilização dos bens naturais. Ela destaca movimentos de contestação que surgiram na década de 90. Em 1993, há a criação da Via Campesina; pouco tempo depois, o levante Zapatista, questionando o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta). “Em 1999, quando a OMC se reúne na cidade de Seattle (EUA), as ruas são tomadas pelo movimento antiglobalização, que pela primeira vez aparece. A reunião é suspensa, há barricadas e fogo na cidade, e a sociedade civil diz: ‘a vida não se vende, o mundo não é uma mercadoria’. Essa campanha dá início ao processo do Fórum Social Mundial”, exemplifica.

Dez anos da ECO 92

Seguindo a linha do tempo, a coordenadora de sustentabilidade da Fundação Heinrich Böll chega até o ano de 2002, quando foi realizada, em Johanesburgo, na África do Sul, a Conferência das Nações Unidas sobre (…) Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, também conhecida como Rio+10. Segundo a pesquisadora, a Conferência foi um fracasso porque os governos tiveram que reconhecer que muito pouco foi feito em 10 anos após a ECO 92. Nesse momento, a solução apresentada pelos países para os problemas ambientais, conforme relata Camila, são as parcerias público-privadas, e, assim, ganha força a ideia de que as empresas precisam ser sócias dos governos para a sustentabilidade acontecer. “Dez anos antes, na Rio 92, era impensável que uma empresa estivesse sentada dentro das Nações Unidas. Isso muda drasticamente em dez anos. O setor privado, as empresas e todas as instituições que visam o lucro começaram a se legitimar como parte de um processo de governar o mundo”, reforça. Em 2005, há uma vitória dos movimentos sociais com o plebiscito contra a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) e também, de acordo com Camila, outro evento importante: o furacão Katrina nos EUA, que expõe a fragilidade do ambiente e das populações pobres frente as mudanças climáticas. “Quando há uma inundação é muito diferente o que acontece numa cobertura no Leblon e o que acontece nas periferias de São Paulo e do Rio, e essa fragilidade dos mais pobres ficou bastante evidente com o furacão Katrina”, comenta.

Mais uma vez, um outro relatório é definitivo na história: o documento chamado A Economia das Mudanças Climáticas, conhecido também como Relatório Stern, escrito em 2006 por Nicholas Stern, ex-economista chefe do Banco Mundial, sob a encomenda do governo da Inglaterra. Camila destaca que o documento vê oportunidades de negócios com o aquecimento global, como a produção de agro combustíveis. Segundo a pesquisadora, a partir desse relatório, o termo economia de baixo carbono começa a ganhar peso nos discursos dos governantes. Já em 2008, seguindo a linha do tempo, explode a crise financeira. “Eu recomendo que vocês assistam ao filme Trabalho Interno – Inside Job, um documentário brilhante sobre de que forma os economistas, conscientemente, foram cúmplices da crise financeira, e sobre como o sistema se aproveita das crises para crescer. Ou seja, a crise ambiental não é um obstáculo ao capital, é uma oportunidade de negócios”, diz.

Segundo Camila, é a partir daí que o discurso “verde” toma ainda mais forma. A pesquisadora destaca que governos do mundo inteiro já entraram em acordo sobre uma métrica para colocar preço nos serviços dos ecossistemas, como a polinização feita pelas abelhas, ou a renovação do ar. “O mercado de carbono é um mercado de compra e venda de direitos de poluir o ar. Hoje já existem dois projetos de lei que tratam sobre como será a legislação para determinar pagamento de serviços ambientais. Um dos principais serviços ambientais, que supostamente vale bilhões, é a polinização das abelhas. Mas a pergunta que não quer calar é: como eu pago as abelhas? Qual é o sindicato das abelhas? Quem vai receber em nome das abelhas?”, brinca.

Hegemonia

A pesquisadora reforça o quanto o conceito de hegemonia é fundamental para compreender os consensos forjados ao longo da história, inclusive o que se aproxima, de defesa da Economia Verde, na Rio+20. “A Economia Verde diz, por exemplo, que as cidades são as mais eficientes e que é ineficiente viver no campo. Uma das tarefas da Economia Verde é esvaziar o campo porque é impossível vender pacotes tecnológicos de transmissão de energia eólica, energia solar e vender várias patentes para as pessoas que estão dispersas em assentamentos, para povos indígenas, quilombolas, que usam muito pouco dinheiro. O campo deve ser o local onde se vai produzir ecoturismo e vender pagamento por serviços ambientais. Mas é preciso pensar em uma pergunta bem básica: quem pode vender alguma coisa? Quem poderá vender serviços ambientais? Quem é proprietário de terra? E nós sabemos que o Brasil é o que tem a mais desigual concentração de terra do mundo. Então, quem irá vender e lucrar novamente será o agronegócio”, conclui.

Camila encerrou sua apresentação falando sobre mais dois instrumentos de implementação da Economia Verde em curso já no Brasil: a Bolsa Verde do Rio e as recentes mudanças no Código Florestal brasileiro. “Durante a Rio+20 haverá um evento imperdível: o lançamento da Bolsa Verde do Rio. O que será vendido? Créditos de carbono, direitos de emissão de efluentes químicos na Baía de Guanabara, títulos das UPP [Unidades de Polícia Pacificadora], porque para fazer bons negócios é preciso ter a pobreza pacificada e militarizada”, afirma. Sobre o Código Florestal, ela explica que o principal capítulo da nova legislação fala justamente sobre incentivos financeiros, o que, para Camila, é emblemático da Economia Verde. “O capítulo dez diz que cada hectare de cobertura vegetal que os proprietários de terra tenham poderá ser inscrito no cadastro rural. Dessa forma, será emitida uma cédula de cobertura vegetal, e uma vez emitindo essa cédula, o proprietário terá 30 dias para registrá-la na bolsa de valores, porque isso poderá ser comprado e vendido. Ou seja, a partir da aprovação do Código Florestal, o fiscal do Ibama pode chegar em uma monocultura de cana de açúcar com 5 mil hectares, com trabalho escravo, e perguntar: ‘cadê a reserva legal?’ Ele vai olhar em volta e não vai ter nenhuma árvore, mas o proprietário vai dizer assim: ‘tá aqui o papel, aqui está a minha reserva legal, eu tenho tantos hectares no Tocantins’”, exemplifica.

Cinismo ambiental

Para a pesquisadora, esse é um prenúncio do que pode acontecer em escala mundial, embora ainda haja obstáculos a essa proposta que precisam ser potencializados. “Daqui a alguns anos pode existir um mercado do que ainda resta da natureza e quem ganhará com a Economia Verde serão os proprietários dos recursos naturais. E o grande obstáculo para isso é que ainda existam no mundo bens comuns, áreas de uso coletivo e povos e populações que ainda acreditam que não é privatizando, e nem através do comércio, que se vai construir outra sociedade e outra natureza”, concluiu.

Uma agenda para a Rio+20


Uma agenda para a Rio+20

O tema Ambiente é complexo de ser debatido, sobretudo pelos estadistas que decidem e que pouco entendem sobre como ele funciona, desconhecendo suas principais demandas. A ótica a ser empregada precisaria adotar o Princípio da Integridade do Ambiente Planetário, mesmo quando ele já se encontra arrasado em muitas áreas. É paradoxal debater quais serão as melhores práticas para o “Desenvolvimento Sustentável” em um Ambiente que se encontra aleijado pelos próprios debatedores, através de suas decisões (ou indecisões). Seria como comprar uma casa semidemolida e começássemos planejando quais os móveis e utensílios que precisaremos possuir, antes de reconstruirmos a casa.

Em demolição

O planeta Terra precisa ser reconstruído!”, este deveria ter sido o tema desta cúpula.

Na Rio+20 foi esperada a participação de mais de cem estadistas, contando com suas assessorias de negociação. Um sem número de organizações não governamentais é previsto, sem considerarmos os grupos de pressão que se organizam de forma variada, clamando por temas no mínimo discutíveis para entrarem na agenda do evento. Temos que observar ainda a presença de repórteres e jornalistas do mundo inteiro, tentando divulgar em seus veículos o que está acontecendo e “quais são as tendências” do encontro. Por melhor que seja a estrutura montada para receber todas essas pessoas, a um passo de se tornarem uma horda, por melhor que sejam as equipes de análise de propostas, apenas uma coisa é certa: não acontecerá qualquer consenso planetário sobre seu Ambiente e o “Desenvolvimento Sustentável”.

Parabenizamos a boa ideia de criar um site para o público responder sobre quais temas considera mais relevantes para a agenda do evento. Mas, foi mal implantada. Primeiro pelo fato de que somente ficou disponível ou bem próximo do início do evento ou durante o curso do evento. Segundo, pelo excessivo número de temas disponibilizados, coalhados de subtemas duvidosos em sua relevância. Não houve uma triagem de quais seriam os temas fundamentais, prioritários e possíveis de serem realizados no curto prazo da Rio+20. Por infelicidade, venceu a filosofia de que “isso é uma ação democrática”.

Reduziríamos os temas centrais à metade, a saber:

v  Desmatamentos e queimadas no planeta.

v  Qualidade das águas do planeta.

v  Processos de desertificação no planeta.

v  Concentração de estoques de recursos naturais do planeta.

v  Propostas de medidas de reabilitação ambiental do planeta.

Concentrando os esforços dos participantes da Rio+20 nos primeiros quatro temas, as propostas de medidas de reabilitação ambiental poderão conter os programas e projetos que, além de atender prioritariamente às demandas do Ambiente do planeta, atendam às demandas humanas, envolvendo educação, habitação, saúde, “serviços ambientais”, “economia verde”, trabalho, “energia limpa”, gestão de resíduos e outros subtemas de interesse econômico e social.

O documento final do evento, com esta abordagem mais simples e objetiva, ainda que não possua a intenção de uma convenção subscrita, criaria compromissos efetivos dos Estados-Nação representados na cúpula, contendo os resultados esperados com a implantação das medidas aceitas pelos Estados presentes.