Obras públicas e arqueologia urbana


A cidade do Rio de Janeiro tornou-se um grande canteiro de trabalho com a realização de obras públicas motivadas pelos eventos esportivos internacionais previstos para 2013, 2014 e 2016. Parece que somente Futebol e Jogos Olímpicos conseguiram estimular as autoridades para uma espécie de revitalização urbana da cidade. Nas escavações que têm sido procedidas pelas empreiteiras estão sendo encontrados diversos tipos de vestígios históricos, datados desde o século XVIII. Em termos históricos, poderíamos dizer “datados de ontem”. Afinal, as terras do Brasil, apesar de muito antigas, constituem uma criança com apenas 512 anos de cultura europeia, embora já bastante deformada se contarmos a partir dos melhores dotes de sua origem.

Corrente e ferrugem, por Jorge de Sousa

Na região do Cais do Porto, uma das portas de entrada dos portugueses ao Brasil, estão sendo encontrados diversos objetos antigos, cemitério com ossadas de escravos, correntes velhas, canhões de navios e outros vestígios de nosso passado colonial. Esse conjunto de achados auxilia a estudiosos a entender um pouco desse passado, mas em nenhuma hipótese faz com que o Cais do Porto seja um reconhecido com um sítio arqueológico. Afinal, uma loja de antiguidades pode possuir diversos objetos antigos e históricos mas nem por isso é considerada um sítio arqueológico.

Sítio arqueológico é um local onde permaneceram preservados testemunhos e evidências de atividades humanas em passado longínquo. Ou seja, é um local onde foram mantidos artefatos, construções ou outras evidências de atividades humanas ocorridas em passado muito distante. Os sítios arqueológicos mais conhecidos correspondem a cidades e templos, soterrados em várias partes do mundo, que demonstram que seus habitantes possuíam uma cultura própria e às vezes diferenciada.

Há poucos dias alguns jornais do Rio anunciaram a descoberta de um “sitio arqueológico” nas obras de um prédio na zona sul. Achamos muito interessante a notícia informando que foram encontrados, no subsolo do Leblon, “pedaços de louças, ferramentas, ossos de animais e azulejos, além de parte de uma edificação provavelmente do século XVIII” e que isso seria um sítio arqueológico.

Para falar seriamente de “arqueologia urbana” devemos nos transferir para cidades italianas, em especial para Roma, que contém inúmeros sítios arqueológicos em seu território, com obras monumentais que remontam ao antigo Império Romano.

Diante dos conceitos particulares do que são sítios arqueológicos, com a continuidade das obras esportivas, é bem possível que sejam descobertos novos sítios em Jacarepaguá, Barra da Tijuca, Deodoro, Ricardo de Albuquerque, Guadalupe, no eixo da Av. Brasil e até mesmo em Copacabana.

Com mais quatro anos de obras públicas na cidade, o carioca ficará espremido em duas áreas opostas: ou colado aos granitos e gnaisses da Serra do Mar ou na pedra da Praia do Arpoador, para admirar Ipanema e Leblon.

Ipanema e Leblon vistos do Arpoador, por Ronaldo Kohn

Rio +20: Cimeira ou Cúpula?


Fóruns internacionais, cimeiras e cúpulas são reuniões mais ou menos reservadas a Chefes de Estado e suas “assessorias especiais”. Vários organismos internacionais realizam esses eventos, sobretudo após a criação da ONU (Organização das Nações Unidas), em 1945.

Cúpula da ONU

Vários são os temas básicos de cada reunião promovida, mas somente nos interessa o tema “Ambiente e seus Derivativos”, iniciado com a realização em 1972, em Estocolmo, na “Primeira Conferência Mundial sobre o Homem e o Ambiente”. O assunto era tão irrelevante naquela época que, além do Primeiro Ministro do país anfitrião, Olof Palme, somente um chefe de estado esteve presente ao evento mundial: a Primeira Ministra da Índia, Sra. Indira Gandhi. Parece haver sido uma piada de muito mau gosto.

É importante lembrar que os Estados Unidos da América havia promulgado, dois anos antes, em 1970, a National Environmental Policy Act (NEPA) e sequer enviaram um simples observador para acompanhar o evento. Evento que, como se diz, decididamente ficou às moscas.

Mas a ONU manteve em seu cardápio de temas de interesse a qualidade do ambiente do planeta. Tanto que a ex-Primeira Ministra da Noruega, Gro Harlem Brundtland foi convidada a presidir a Comissão Brundtland, entre 1983 e 1987, que se dedicou ao estudo das variadas relações entre o progresso das nações e seus impactos sobre o ambiente do planeta. Essa comissão era uma entidade vinculada a ONU.

E foi em um evento da Comissão Mundial sobre Ambiente e Desenvolvimento, realizado em 1987, onde teve origem o conceito do “desenvolvimento sustentável”, contendo a seguinte definição:

É o desenvolvimento que procura satisfazer as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade das gerações futuras de satisfazerem as suas próprias necessidades; significa possibilitar que as pessoas, agora e no futuro, atinjam um nível satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural, fazendo, simultaneamente, o uso razoável dos recursos naturais e preservando as espécies e seus habitats primitivos.

Vamos abrir um parêntesis para discutir este conceito sob a ótica de sua possibilidade de aplicação no mundo real, de sua essência e de sua provável redundância.

Pelo menos desde a década de 1960 a economia e a sociologia já apresentavam conceitos distintos para explicar o significado dos processos de “crescimento” e de “desenvolvimento” de uma nação.

Crescimento” significava gerar e concentrar as riquezas de alguns segmentos produtivos, sem distribuí-las de forma balanceada, através da remuneração adequada da competência de cada cidadão em produzir riquezas para terceiros. Em suma, crescia o capital e definhava o trabalho, com poucas exceções para grupos de investidores e de profissionais a eles alinhados. A visão básica dos investidores resumia-se na redução dos custos da produção e no aumento dos retornos econômicos e financeiros exclusivamente para seus negócios específicos.

Por outro lado, “desenvolvimento” possuía significado bem distinto e considerado bastante ousado, quase “comunista”. A riqueza gerada precisava ser distribuída adequadamente, remunerando em quotas proporcionais o capital e o trabalho. Nem todos os resultados monetários deviam pertencer somente aos investidores, cabendo ao Estado investir parcela destes resultados, via tributos, em infraestrutura destinada à melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, sobretudo, na educação, habitação, saúde, transporte e segurança.

É fácil verificar que o processo de crescimento de parcelas sociais de uma nação é variável e frágil, função direta da conjuntura mundial. Já o processo de desenvolvimento tem chances de se sustentar por maior prazo, sofrendo menores impactos da conjuntura mundial adversa. Grosso modo, o crescimento de uma nação não tem como sustentar-se; o desenvolvimento, quem sabe, talvez.

Concluímos este parêntesis afirmando nosso ponto de vista: “desenvolvimento sustentável” não é um conceito, mas apenas uma filosofia de busca de um estado de sustentabilidade. Em sua essência estrita, é uma utopia que não será alcançada com as tecnologias de que hoje dispomos. Por fim, trata-se de uma expressão redundante há pelo menos meio século: qualquer processo de desenvolvimento de uma nação anseia por ser sustentável. Falar na “novidade do desenvolvimento sustentável” é mera retórica, maquiagem pseudo-intelectual.

Grato. Retorno à narrativa principal.

A Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente e Desenvolvimento, também conhecida como Eco-92, Cúpula ou Cimeira da Terra, realizada em junho de 1992, reuniu mais de cem chefes de Estado no Rio de Janeiro. Alguns talvez realmente acreditassem estar buscando meios de conciliar desenvolvimento socioeconômico com a conservação dos ecossistemas da Terra.

Desde os anos de 1970 acompanhamos a realização de uma enorme quantidade de Cimeiras do Clima, montadas em diversos países. Uma única preocupação “científica” nestes eventos: o aquecimento global causado por fatores antropogênicos e as profecias de políticos e artistas, suportados pela mídia mundial, anunciando catástrofes arrasadoras da vida no planeta. Verdadeiras pataquadas com elevado desperdício monetário, reunindo estadistas analfabetos, inclusive em climatologia, e ideólogos esperando serem seguidos bovinamente pela sociedade mundial.

Mesmo assim, ficamos atentos aos resultados de todos os eventos mundiais vinculados ao ambiente do planeta, mas optamos por não estar presentes em qualquer um deles.

Contudo, em fevereiro de 2004, recebemos um convite irrecusável do Ministério do Ambiente e do Território da Itália para participar do International Forum on Partnerships for Sustainable Development. Aceitamos, evidentemente. Foi realizado em Roma, apoiado pela ONU, nas instalações da FAO (Food and Agriculture Organization). Histórico local da cultura do ocidente, bem junto às ruínas do Fórum Romano.

Base histórica da civilização ocidental: o Circo.

O que pudemos verificar de resultados positivos e concretos nesses 40 anos da ação de instituições multinacionais com relação ao ambiente planetário foi absurdamente nada. Todas as aparentes melhorias em termos de sua sustentabilidade teriam ocorrido sem os desperdícios investidos nesses gigantescos eventos.

A Rio+20, Conferência sobre o Desenvolvimento Sustentável, a ser realizada na próxima semana, parece apresentar as mesmas tendências das demais cimeiras ambientais: muitas palestras e conferências, realização de eternas novas amizades e congraçamentos, almoços, jantares, bebidas e bate-papos. Assinaturas de inúmeros protocolos de intenção, juras de posturas ambientais perfeitas e total esquecimento dos acordos subscritos no exato momento em que os líderes entram em seus aviões e retornam às suas origens, bêbados de boa vontade.