PEC ameaça o Ambiente Brasileiro


Ricardo Kohn, Gestor do Ambiente.

Com finalidades práticas, o Processo de Licenciamento Ambiental foi implantado no Brasil, em 23 de janeiro de 1986, a partir da Resolução Conama No 001. Seu objetivo, a meu ver, era proteger o Ambiente Brasileiro das incursões feitas pela engenharia em terrenos frágeis, com notórias vulnerabilidades de uso e ocupação pelo dito Homo sapiens. Saliento que esta Resolução apenas operacionalizou uma parcela da Política Nacional do “Meio Ambiente”, datada de 31 de agosto de 1981 (Lei No 6.938).

Após 32 anos de vigência, a Resolução demonstrou-se adequada, embora haja sido prejudicada pela burocracia burra de funcionários públicos, que acabaram por torna-la um alçapão com armadilhas para investidores. Acabaram por inventar três licenças ambientais, as quais assim sumarizo:

  • Licença Prévia (LP) – a ser concedida mediante a aprovação dos estudos ambientais referentes ao projeto do empreendimento;
  • Licença de Instalação (LI) – a ser concedida mediante a aprovação de um plano para otimizar o desempenho ambiental das obras e da futura operação do empreendimento;
  • Licença de Operação (LO) – a ser concedida após a análise do órgão ambiental envolvido, para confirmar se o “como construído” está em acordo com o que até então foi licenciado.

Durante mais de três décadas, inúmeras normas foram criadas, a se tornarem uma muralha quase intransponível para os estudiosos do Ambiente, em última análise, os responsáveis pelos Estudos de Impacto Ambiental definidos na norma original.

Não tenho dúvida que o Processo das Licenças Ambientais (PLA) precisa e deve ser simplificado, desde que mantenha sua natureza original: a avaliação sistemática de impactos ambientais, nas etapas de projeto, obras e operação de um novo empreendimento.

Todavia, em 2018, surge a discussão da malfadada PEC 65, proposta por um tal Acir Gurgacz (que existe e é senador por Rondônia), relatada por Blairo Maggi (dono da soja e do senado em Mato Grosso). Propõe que, a partir da aprovação de um mero Estudo Preliminar de Impacto Ambiental, nenhuma obra poderá ser suspensa ou cancelada (!). Na prática, isso significa que o processo das licenças ambientais deixará de existir. Ou seja, de acordo com o cérebro precário destes senadores encerram-se as avaliações essenciais, que sempre visaram a demonstrar se um projeto de engenharia é ambientalmente viável ou não.

PEC 65, Nunca!

PEC 65… NUNCA!

Esses dois “interessados” esqueceram-se que, além deles, há centenas ou milhares de cidadãos diretamente envolvidos com o processo do licenciamento ambiental. Em Estados Democráticos, todos precisam ter a palavra nas audiências públicas. Classifico-os como notórios atores legais do processo. São eles:

  • O empreendedor e sua equipe, na qualidade de responsáveis pelo investimento que será realizado, seja em uma nova organização produtiva, seja na ampliação de uma já existente;
  • Funcionários do órgão público responsável pelas licenças; pelo estabelecimento de termos de referência; pela avaliação dos documentos produzidos por empresa consultora; pelo estabelecimento de compensações ambientais, caso se façam necessárias; bem como, pela emissão de licenças relativas a cada etapa do licenciamento;
  • A sociedade civil, representada por instituições da área de influência do projeto, a envolver ONG de diversas naturezas, universidades, partidos políticos, associações de classe, associações de moradores e vizinhança do projeto;
  • O Ministério Público Federal e Estadual, através de procuradores e promotores;
  • Outras instituições públicas que administram setores específicos, tais como ICMBio, FUNAI, IPHAN e INCRA, entre outras;
  • Por fim, a empresa consultora e equipe de trabalho que realizou os estudos ambientais para obtenção das licenças.

Aqueles que já participaram de audiências públicas de licenciamento sabem muito bem o que acontece entre estes educados atores: tumultos, conflitos e, às vezes, pancadarias, são típicos para projetos considerados discutíveis, justo por serem mais impactantes.

Proposta para o processo de Licenças Ambientais

A ser assim, com vistas a amenizar tumultos e conflitos, proponho as seguintes medidas normativas, baseadas na racionalidade, bem como nas práticas ambientais que ocorrem em nações desenvolvidas:

  • Em substituição da Licença Prévia, criar a Licença de Localização, que demandará um Estudo Preliminar de Viabilidade Ambiental (EPVA). Os EPVA, por possuírem seções mais sucintas e objetivas sobre os espaços físico, biótico e antropogênico, podem ser elaborados de forma mais rápida e menos onerosa que os EIA. Todavia, são conclusivos quanto à localização ou não do empreendimento na região desejada pelo investidor. Este não precisará possuir um projeto básico ou executivo de engenharia; basta um croqui do empreendimento com suas dimensões e dados básicos de sua operação – insumos, processos produtivos e descartes, entre outras.
  • Objetivar o EIA, tornando-o estudo complementar do EPVA realizado, dotado de um processo detalhado de avaliação parametrizada de impactos, bem como de um Plano Executivo de Gestão Ambiental (PEXA) das relações promovidas pelas obras do empreendimento com sua área de impactos potenciais. O PEXA deve ser estruturado com metas, programas e projetos ambientais que visem à manutenção da qualidade ambiental da região afetada. Após aprovar o EIA e o PEXA, o órgão competente concede a Licença de Construção.
  • Criar a Licença de Gestão Ambiental das Obras, que demandará do investidor e da empresa construtora firmarem um compromisso contratual com o órgão público de controle ambiental, com vistas a implantar o Plano Executivo para Gestão Ambiental das obras (PEXA). Saliento que a equipe de gestão ambiental das obras precisa ser desvinculada da construtora e terá gerência própria. O Gestor Ambiental das obras emitirá relatórios periódicos para o órgão ambiental competente. Uma vez finalizada a construção, tendo sido aprovado o Relatório Consolidado das Obras, será concedida a Licença de Operação.

De fato, para manter esta Licença, a empresa em operação terá prazo de até 1 (hum) mês para implantar o Plano Executivo de Gestão Ambiental de suas práticas produtivas. Da mesma forma, o Gestor Ambiental da empresa emitirá relatórios periódicos para o órgão ambiental competente. Este, por sua vez, poderá efetuar inspeções ambientais na empresa, de modo a aferir a qualidade ambiental existente, tal como foi apresentada nos relatórios. Com essa proposta de trabalho, o órgão ambiental poderá monitorar as variáveis da operação da nova empresa, com vistas a manter sua Licença de Operação.

A tabela abaixo mostra a sequência deste processo e seus prazos de resposta:

Processo de Licenças Ambientais – PLA

Investidor e Consultora Órgão ambiental público
Estudo necessário Elaboração Licença ambiental Prazo de resposta
EPVA 2 meses Licença de Localização (LL) Até 2 meses
EIA e PEXA para obra 4 meses Licença de Construção (LC) Até 2 meses
Relatório final das obras 1 mês Licença de Operação (LO) Até 1 mês

Desse modo, o PLA completo de qualquer projeto pode ser realizado com baixíssimo custo, no prazo de até 5 meses. Observo que não levo em conta o cronograma das obras, uma vez que é variável, função da natureza do projeto de engenharia.

Considerações

De fato, a Resolução No 001/1986 do Conama proporcionou um expressivo impacto positivo no mercado de trabalho brasileiro. Destaco quatro setores que logo responderam à sua publicação:

  • Educação, através de cursos universitários em vários níveis – graduação, mestrado, doutorado, MBA e pós-graduações;
  • Ampliação do mercado de trabalho para profissões relacionadas às Ciências Humanas – antropologia, arqueologia e sociologia, dentre outras – e sua integração com as práticas da engenharia. Assim, graças a esta Resolução, foi criada a Engenharia Ambiental;
  • Fundação de inúmeras empresas de Consultoria Ambiental, sobretudo nas capitais de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais;
  • Por fim, a Geração de Conhecimento, visível nas incontáveis obras técnicas publicadas no país, durante os últimos 30 anos.

Dessa forma, esta Resolução induziu a estruturação de um Mercado Ambiental, antes inexistente no país. Centenas de milhares de profissionais encontram-se integrados a este mercado e dele dependem para produzir.

Diante deste cenário, sem dúvida factual, seria absurda a aprovação da PEC 65/2012! Trata-se de uma proposta feita por dois parlamentares – por sinal, duvidosos –, a defender “interesses pessoais” inexplicáveis, contra a necessidade de milhares de brasileiros, honestos e trabalhadores.