“Queremos ter certezas e não dúvidas, resultados e não experiências; mas não percebemos que as certezas só podem surgir através das dúvidas, enquanto os resultados, somente por meio das experiências” – Carl Gustav Jung.
De súbito, o palestrante falou
Sejamos racionais e dialéticos, nunca paranoicos, pois o calor da imaginação desenfreada é sempre uma barreira implacável ao nosso raciocínio. Reinventemo-nos a cada instante, sempre a duvidar de nossas certezas.
Perguntam-me, “a quais certezas me refiro”? Respondo-lhes: “a todas; certezas definitivas só existem no tempo passado”. Certezas momentâneas permanecem como dúvidas. Afinal, todas as nossas certezas foram as dúvidas que nos conduziram até aqui: nesse exato momento, a esse salão, com olhos nos olhos de cada um. Alguém discorda disso?
Pelo silencio ensurdecedor que ouço, creio não haver discórdia. Assim, continuo a palestra.
Dúvidas são ansiedades fortuitas, que podem ser motivadas pelo interesse em esclarecê-las. Coisas para salas de aula. Mas também podem ser criadas por fugas decorrentes de ameaças de acasos inesperados. Estes, são surpresas que podem trazer bons e maus resultados. Vem daí o medo de enfrentarmos acasos, pelo simples fato de não termos qualquer certeza. Claro, só temos uma pálida ideia – que é uma bela dúvida – de como vamos nos comportar diante de ameaças provindas de acasos.
Chamo a atenção para o fato de que são perigosos todos aqueles que afirmam nunca terem tido qualquer dúvida na vida. Consideram-se os Donos da Certeza. Mas, por outro lado, tolos e otários serão os que neles acreditarem.
Creio que alguns de vocês devem estar a se perguntar:
─ “Afinal, aonde esse cara quer chegar?”
Agradeço o interesse de todos. Esta dúvida é bem-vinda. Pretendo que, ao fim dessa palestra, todos sejamos capazes de identificar certezas e dúvidas.
Todavia, nada melhor para o aprendizado de uma técnica do que aplicá-la a um caso real.
Certezas e dúvidas na Ação Penal 470
Nos últimos dois anos o assunto da moda, mais discutido no Brasil, foi conhecido internacionalmente como Escândalo do Mensalão, vulgarizado com esse apelido por envolver personagens políticos de destaque que, ora eram os pagadores de propina – os “mensaleiros” –, ora recebedores de vultosos desvios de dinheiro público – os “mensalistas”.
Todos eles tinham certeza de que nunca seriam descobertos. Estreparam-se! O Procurador Geral da República, uma espécie de Xerife do Sistema Público, indiciou 40 elementos. Enviou para o Supremo Tribunal Federal toneladas de indícios para serem avaliados e, caso a Alta Corte aceitasse a denúncia, instauraria uma Ação Penal. O que foi feito, há absoluta certeza disso.
No entanto, existe dúvida quanto à hierarquia dos elementos que cometeram crimes contra a administração pública. Uma grande lista de crimes. Tudo leva a crer que o Diretor Executivo da quadrilha foi arrolado pelo Xerife. No entanto, a quadrilha não teria um Presidente? Existem dúvidas.
Passaram-se quase dois anos de julgamentos e chicanas. Os réus contrataram as mais caras bancas de advocacia do país para defende-los, mesmo sempre com a certeza de que não seriam condenados. Afinal, a maioria dos ministros do Supremo fora indicada por gente da mesma raça deles. Gastaram muitos milhões de Reais mas, mesmo assim, a maioria dos réus foi condenada e apenada.
Há dúvida se o tempo de cadeia para alguns condenados não foi reduzido de forma deliberada por juízes da mesma jaça. É cruel, mas há muitas dúvidas. De toda forma, com a certeza de que a legislação penal brasileira permite empurrar certos julgamentos com a barriga, teve início a fase dos recursos: embargos declaratórios, embargos infringentes e, aguardem, pois ainda teremos a temporada de embargos dos embargos.
Existe certeza de que qualquer condenado precisa ser mi ou bilionário para manter a tropa de advogados sempre alerta e muito bem paga, de preferência em bancos de Paraísos Fiscais. E com mais um detalhe: condenados e advogados de defesa com conta na mesma agência. Parece que essa estranha figura jurídica é chamada Evasão Legal de Divisas. Mas há quem duvide.
Poderíamos ficar confabulando sobre certezas e dúvidas durante séculos. Mas vou poupá-los dessa ameaça. Não consideramos as prisões que ora ocorrem, nem as que em breve deverão acontecer. Esquecemos das certezas de certos prisioneiros que desejam cumprir suas penas em um Resort no Taiti. Sequer lembramos das dúvidas de outros condenados, sobre em que faculdade deverão cursar o Mestrado de Roubos e Desvios, com área de concentração em Corrupção Administrada.
Espero que com essas dicas vocês passem a duvidar de todas as próprias certezas e plantem um grande pomar de dúvidas em si mesmos.