Às vezes paradoxos são venerados


Ricardo Kohn, Escritor.

Embora uma das definições de “Paradoxo” seja “declaração ou proposição que parece se autocontradizer, mas que, na realidade, expressa uma verdade possível”, optou-se por aceitar a seguinte, como mais definitiva: “proposição falsa ou autocontraditória”.

A primeira é dúbia, pois fala em “verdade possível”. Contudo, nem tudo o que é verossímil é verdadeiro e paradoxos não são questões de verdade ou mentira. São melhor definidos como contradições, incoerências. Em suma, paradoxos são contrassensos, disparates ou até absurdos.

Um exemplo de paradoxo é o arranha-céu que está a quase dez anos sendo construído em Nova York, no espaço deixado pelas Torres Gêmeas demolidas. Não se deve avalia-lo apenas pelas demonstrações de inteligência e pioneirismo que a engenharia norte-americana dá ao mundo. É um gigante de ostentação em vários sentidos. Sua estrutura metálica é revestida por um “colete de concreto” mais resistente do que o utilizado em usinas nucleares. Dizem ser uma torre à prova de choque com qualquer avião existente no mundo, bem como capaz de enfrentar ilesa a fúria de tornados e vendavais. Por isso, este prédio já está sendo venerado como uma obra ímpar, demonstração do domínio tecnológico e do poder daquele país.

Torre da Liberdade

Vista do futuro da Torre da Liberdade

A altura da chamada Torre da Liberdade (Freedom Tower), com seus 104 andares, é de cerca de 540 metros, quase 200 metros mais alta do que o Empire State. Sem considerar as “provocações” de que se reveste essa construção (que decerto não é à prova de mísseis balísticos), há outros aspectos que, para muitas pessoas, são paradoxais.

O primeiro é a manutenção permanente da dor pela perda da vida de tantas pessoas em atos terroristas, sem considerar que no entorno desse palco há vizinhos que não são obrigados a aceitar essa iniciativa de dor permanente, que se tornou uma espécie de “imposição patriótica”.

Embora tenham sido investidores privados os responsáveis pela obra, com uma economia que já se anunciava como “bem mal das pernas” desde o governo de Bush Filho, o retorno monetário dos bilhões de dólares já injetados na construção deverá ser lento.

Por fim, há a questão ambiental envolvida na construção e que se resume em uma única pergunta:

─ Sem considerar a sua futura manutenção, quantos milhões de toneladas de ferro, soldas, cimento, areia e outros materiais de acabamento foram retirados do ambiente para erguer esta torre e as demais?

Por outro lado, também têm-se vários “paradoxos brasileiros“. O mais recente está a acontecer na cidade do Rio de Janeiro. Desde julho de 2012 acusamos, em um dos cinco artigos-denúncia sobre os problemas do BRT Transoeste, os buracos na sua pista exclusiva que já começavam a surgir. Para confirmar basta clicar em Rombo da pista do BRT Transoeste.

Hoje alguns jornais noticiam que há vários buracos na pista do BRT e seus veículos são obrigados a trafegar pelas faixas dos automóveis, na altura de Guaratiba. Considerando que a pista exclusiva foi inaugurada há apenas seis meses, é um absurdo que este meio de mobilidade urbana, implantado para melhorar as condições de trânsito no Eixo Santa Cruz-Barra da Tijuca, passe justamente a prejudica-lo.

Os buracos na pista do BRT

Os buracos na pista do BRT

Analisando a foto dos mais jovens buracos (reprodução de O Globo), parece que a camada de asfalto da pista do BRT foi aplicada diretamente sobre o sob, sem as camadas de base e sub-base, que dão maior resistência e durabilidade ao pavimento. Dizer que a destruição do asfalto se deu em função das fortes chuvas de dois dias na semana é uma brincadeira. Todas as estradas, vias e pistas que se prezam possuem sistemas de drenagem de águas pluviais.

Para seus primeiros seis meses em operação, o relatório de desempenho ambiental deste “paradoxo” de mobilidade urbana é simples:

─ “Várias colisões e atropelamentos. Cinco pessoas mortas e algumas feridas. Choque entre dois veículos do próprio BRT. Trechos com pavimentação destruída. Trechos da ciclovia sendo quebrados ou dissolvidos. Ocupação ilegal no corredor de passagem do BRT. Tudo isso em apenas seis meses. Formidável!”.